Regressos ou a Síndrome de D. Sebastião

Perdem eleições. Retiram-se mais ou menos da vida política. Assumem travessias do deserto com oásis à mão. E preparam o regresso. Paulo Portas, Santana Lopes, outros. Já vimos isto tantas vezes: mais ou menos implicitamente, os regressos parecem ter um fundo de sebastianismo. Depois das “trevas” da ausência, o regresso esperado (ou não) do líder. Nada mais português.

Não sou analista político, para que se saiba. Mas lá vou acompanhando o que se passa. Paulo Portas e Santana Lopes, depois de um período de mais ou menos dois anos (coincidência com a metade do “consulado” de Sócrates?) de algum recato (pelo menos no sentido parlamentar da coisa), decidiram voltar. Um assumidamente, outro menos assumidamente. Um claramente a desafiar o líder do partido e propondo a sua substituição, outro com críticas ao desempenho do seu próprio partido e do seu líder. Os dois publicamente.
Já se sabe: na política e noutras actividades é comum a travessia do deserto para o regresso em grande, com aura de salvador do que está mal. Sebastianismos. Só que a travessia do deserto já não é o que era. Como no Dakar, lá estão as equipas de apoio, para que não falte a água (ou neste caso, a visibilidade). Um esteve como comentador na televisão, outro escreveu um livro e tem aparecido cada vez mais em entrevistas e declarações públicas. Ou seja, afastados, mas qb. Já se estava a ver que iam voltar (um já disse que ia, outro parece que vai dando a entender isso).
Mas porque é que um psicólogo pega nisto? Porque me parece um bom exemplo do nosso funcionamento enquanto povo: o tal síndrome de D. Sebastião. Os bons homens que perdem, afastam-se, mas estão dispostos a regressar, a bem da nação, do partido, do clube de futebol, seja do que for.
Não os critico. Parece até uma coisa cultural. Mas vejo alguns problemas nesta nossa visão dos homens salvadores, dos cíclicos D. Sebastiões: por um lado, esta sombra do antecessor que paira sobre o actual líder parece condicionar a sua actuação. Por outro lado, com um líder em funções e outro mais ou menos presente, a emergência de outras figuras fica dificultada, prejudica uma renovação possível. É assim o jogo da política, da vida. Peguei no Paulo Portas e no Santana Lopes, mas facilmente qualquer um de nós consegue extrapolar e ver situações semelhantes em diversos campos de acção.
Mas uma coisa também é verdade: se os D. Sebastiões existem é porque são capazes de tal. É porque assumem os seus projectos pessoais, é porque mostram iniciativa e capacidade combativa. É porque, talvez, não existam figuras suficientemente fortes para os substituir. Talvez porque , a estas, lhes falta a coragem ou a ambição.
Gostava de ver renovação. Uma geração mais nova (de ideias) a surgir, em todas as áreas. Que nas manhãs enevoadas não surgissem outra vez os mesmo Sebastiões, mas novos Antónios, Marias, Albertos. De preferência com ideias novas. E com vontade de fazer o seu trabalho e depois passar a pasta a alguém novo.

Publicada porVictor Silva à(s) 20:46  

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